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No Brasil, o machismo e o racismo do Congresso são pautas de costumes

19/06/2024 16:56

Escola Livre de Redução de Danos

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No Brasil, o machismo e o racismo do Congresso são pautas de costumes

Mulheres, população negra, indígenas, pessoas pobres ou que fazem uso de drogas vivem em constante risco, sob a ameaça de deputados da extrema-direita

O projeto de lei que equipara aborto após 22 semanas ao crime de homicídio, com pena duas vezes maior à mulher do que ao homem que a violentou, revelou ao País o desprezo com que parte significativa do Congresso Nacional trata grupos sociais que não sejam os dominantes. Mulheres, população negra, indígenas, pessoas pobres ou que fazem uso de drogas vivem em constante risco, sob a ameaça de deputados da extrema-direita e do centrão. Juntos, esses dois blocos somam mais de 300 dos 513 parlamentares, o suficiente para aprovar até propostas de emenda à Constituição. Só a pressão popular, portanto, pode detê-los.

 

O projeto de lei 1904/2024 - chamado de PL do Estuprador ou da Gravidez Infantil - chocou pelo nível de perversidade que propõe, fazendo com que o debate ultrapassasse a polarização entre direita e esquerda, Lula ou Bolsonaro. A reação ganhou as ruas para além das redes sociais e forçou uma divisão desse bloco que, até então, vinha votando unido nas pautas que ameaçam direitos fundamentais e vulnerabilizam a democracia.

 

É importante destacar que, se não fosse a pressão popular liderada por mulheres, o famigerado projeto de lei seguiria o curso em ritmo acelerado, sem precisar passar pelos debates nas comissões temáticas, graças à manobra do presidente Arthur Lira (PP-AL). Ele agiu para aprovar o regime de urgência na tramitação da proposta que, se transformada em lei, iguala a legislação brasileira à do Afeganistão. É a demonstração que também temos a nossa “bancada Talibã”.

 

O PL da Gravidez Infantil não é fato isolado vindo do Congresso mais reacionário desde a redemocratização do Brasil. Ele se junta à PEC que criminaliza o usuário de drogas e agrava o racismo estrutural no País, nos quesitos inconstitucionalidade e violação de direitos fundamentais. A proposta foi aprovada na Comissão de Justiça da Câmara dos Deputados e, agora, tem sinal verde para seguir para votação em plenário. 

 

O pretexto da proposta, de autoria de Rodrigo Pacheco (PSD-MG), presidente do Senado,  é o “combate às drogas”; mas o que se planeja é o desmonte do conjunto de direitos e garantias individuais previsto no artigo 5º da Constituição Cidadã. Esse é o cofre a ser aberto por parlamentares da extrema-direita e do centrão, que - na verdade - são a mesma coisa.

 

Diferentemente do PL da Gravidez Infantil, com exceção de setores da sociedade civil organizada e parlamentares com atuação na defesa dos direitos humanos, foram poucas as vozes que romperam o silêncio para destacar o perigo que a PEC 45/2023 impõe às populações pobres e pretas, incluindo as pessoas que não fazem uso de substâncias desde que sejam moradoras de territórios estigmatizados. 

 

A “PEC das Drogas” - como passou a ser chamada a proposta, numa definição que distorce o real o debate - foi tratada politicamente como pauta de costume, assim como o aborto, embalada em versões mentirosas e exageradas de pânico moral e populismo penal. Algo que afetaria apenas um determinado grupo, o grupo desviante de pessoas que usam drogas e - portanto - precisariam estar na prisão ou numa casa de recuperação, preferencialmente uma entidade privada financiada com dinheiro público.

 

A proposta que insere na Constituição a criminalização de porte e posse de qualquer quantidade de maconha ou outra substância pretende alterar uma Cláusula Pétrea. O que está ali previsto tem esse nome justamente porque não pode ser alterado ao sabor da ideologia política dominante do momento do debate.

 

Caso seja aprovada, será a primeira vez em 36 anos que esse arcabouço de direitos e garantias individuais será quebrado. A Constituição foi promulgada em 5 de outubro de 1988. Um avanço democrático e uma tentativa de ruptura com o passado recente do Brasil de desigualdades e violências em dimensões continentais. A proposta também viola o princípio da proporcionalidade, algo essencial ao conceito de justiça. E desconsidera a violência policial e a seletividade do sistema de justiça criminal no País.

 

O Brasil nunca acertou devidamente as contas, no sentido da reparação e inclusão social, com as populações e famílias que sofreram os impactos da colonização, escravização e subjugação que foram exercidas como políticas de Estado. Caso essa PEC seja aprovada, abre-se a janela para um futuro próximo nebuloso, de mais violência e custo social, sem que sejam afetadas as reais engrenagens que mantêm o meganegócio do tráfico intercontinental de drogas.  

 

O PL da Gravidez Infantil e a PEC das Drogas são defendidos pelos mesmos grupos políticos que, em 2022, aprovaram na Câmara a proposta que possibilita a  privatização das praias brasileiras e, recentemente, mantiveram o veto do ex-presidente Jair Bolsonaro ao projeto que permitiria tratar como crime a produção e disseminação em escala de fake news. 

 

As pautas parecem ser distintas, específicas, sem relação entre si. Mas todas elas servem para chantagear o governo Lula, alimentar a extrema-direita, atacar a democracia e ameaçar direitos e a garantia de vida da maioria da população do Brasil. Assim como a democracia racial, é um mito a figura do bolsonarista moderado. 

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